Velocidades
É. Cheguei a uma conclusão definitiva. Hoje a velocidade dos relacionamentos é a principal causa das separações. Na ânsia de não encontrar ninguém, catamos qualquer um. Isso mesmo. Parece duro, mas é a mais pura realidade.
Eu, com a minha cabeça do século passado, desculpem, não consigo ver com bons olhos a maneira como as coisas se intensificam rapidamente entre os casais. Sério. É assustador! Eu fico sempre pensando em como as coisas andaram lentamente comigo. Acredito que foi por isso que o que eu tive durou tanto. E, veja bem, nem no fim íamos ao banheiro de porta aberta. Nem no fim éramos grosseiros ou ofensivos ou críticos de forma gratuita. Nem no fim fomos escrotos um com o outro.
Por que? Simples. A relação que cresce aos poucos cresce com cerimônia, com critério. E, por que não dizer, com magia, com mistério. Já disse isso aqui, nos perdemos um do outro quando deixamos de ser um mistério. Quando o outro acha que somos jogo ganho. Quando o outro acha que nos desvendou por completo.
E esse povo de hoje em dia? O que faz? Bota pra dentro da vida, apresenta a família, os amigos. Chama pra passar o natal na casa dos pais, coloca foto no porta-retrato (Pior! Num álbum do Facebook que o título é um coraçãozinho, sabe? Breeeeeega demais!). Enfim. Com 10 dias de relacionamento já chama de meu amor, diz “eu te amo” e começa a olhar apartamento.
Não, não e não! Essa coisa de trazer em casa já é complicado. Minha casa é meu mundo. Não coloco pra dentro da minha casa quem eu não conheço, não confio. Não gosto de intimidade.
Sabe qual é o principal problema de levar as coisas rápido demais? É que elas acabam rápido demais. Você ganha intimidade muito rápido. Pro bem e pro mal. Em três semanas você já estará querendo mudar o jeito que o outro se veste. Como essa criatura come. A maneira que ela fala com os pais. Fora que você já vai achar que está tudo errado na maneira que a pessoa leva a carreira, como ela guarda as meias, como ela trata a empregada e quanto ela gasta de celular todo mês. E ainda tem aquele irmão vagabundo, que pede dinheiro emprestado. E aquela sobrinha que ganha todo ano uma joia de presente, onde já se viu gastar tanto com joia pra criança! E então a sogra começa a te ligar, pra saber todas as coisas que a pessoa não conta pra ela e a cunhada te chama pra fazer compras ou o cunhado pra jogar futebol. Que sofrimento essa família! Você nem gosta tanto deles assim e tem de aturar a intimidade!
Vocês tem cinco semanas juntos e a sua mãe tá consultando as datas nas igrejas, “só pra saber né… vai que…”
Aí vem a obrigação. “A gente não vai se ver hoje? Por que? Você tá diferente! Foi alguma coisa que eu fiz? Algo que eu não fiz?” E o outro passa a querer te ler nas entrelinhas. Se acha vidente em termos de você e quer adivinhar cada pensamento. Quer acompanhar cada segundo seu. E vocês só tem seis semanas juntos…
Agora, imagine se nessas seis semanas, vocês falassem muito pouco um do outro. Assim, só falassem do que gostam de comer, dos seus sonhos. Se acreditam ou não na vida após a morte. Se pedem o sanduíche do McDonald’s com ou sem picles. Se encontrassem em quartos de hotel, de motel. No carro. No armário do trabalho. Na rua, vá lá! Que cada momento juntos fossem mil suspiros e que cada descoberta sobre o outro fosse mínima. Não. Não me conte mais. Eu quero o mistério de você. Eu quero me apaixonar bem devagarinho. Eu não quero te amar. Amar é inteiro, é entregar o jogo. Eu quero descobrir cada parte. Sem pressa. Sem ânsia. Quero te despistar. Faz parte. Estamos firmando as raízes. E, se isso que temos crescer, tudo bem, teremos frutos algum dia. Mas não hoje. Hoje só quero suspirar por você.

